terça-feira, 7 de abril de 2015

A roda do ônibus roda roda, roda roda, roda roda - BEDA #7


Antes de eu começar esse texto, deixa eu situar vocês de fato importante: eu presto atenção nas conversas alheias. Eu sei que não é a parte mais nobre de mim, mas é o meu jeitinho. E se a pessoa anda por aí sexting pelo WhatsApp, eu tô sabendo, porque se a pessoa se importava de alguém ver, ela esconderia, correto?
Então tá.
Eu estudo bem longe de casa, o que me obriga a passar bastante tempo dentro do transporte público paulistano. Eu sou bastante desastrada na vida, o que significa que frequentemente estou sem fones de ouvido (porque quebrei) no transporte público paulistano.
O que significa que eu escuto muito (quando não estou dormindo).
E a roda do ônibus rodando pela cidade.
Estava eu no ônibus, voltando pra casa, sentada no fundo e três caras conversavam ao meu lado. Eu juro pra quem quiser ouvir que eles passaram os quarenta minutos em que estive dentro do ônibus falando sobre meninas. Porque tinha uma fulana que morava em Santos, e a outra que era ex do irmão, e tinha a guria da saia torta, e a foto de não sei quem jogada no chão depois do rolê de sábado.
A parte mais chata de mim pensou que se fossem meninas conversando sobre caras, todos no ônibus estariam julgando, mas ninguém dava a mínima que os três caras estavam escrachando as meninas que eles já tinha pegado. A parte menos judgemental de mim estava achando muito engraçado que eles falavam mal, mas realmente queriam repetir a dose com fulana de tal que era x quilos mais gorda que ciclana, mas x vezes mais legal.
E a roda do ônibus rodando pela cidade.
Eu também leio o WhatsApp. Leio sim. Porque eu acho muito fofinho quando a pessoa está encarando o celular no ônibus e sorri. É um sorriso tão involuntário, nem sei se a pessoa nota que está sorrindo. Em geral é em algum grupo. Ás vezes, quando eu dou sorte, é o "Amor ♥♥".
Tenho percebido também um padrão nessas conversas de WhatsApp: quando é alguém de mais idade assim, a fonte do celular é enorme e sempre tem alguma menção a Deus ("deus te abençoe", "graças a deus", "deus sabe o que faz"); quando a mensagem é pro "Amor ♥♥", em geral é perguntando se já chegou em casa/no trabalho ou se vão poder sair no fim de semana; quando são duas mulheres conversando, quase sempre é sobre macho (ah, e sempre tem alguém que configurou a fonte do celular pra comics sans) e nunca vi dois caras conversando entre si no WhatsApp, só se for num grupo: em geral é sempre um cara falando com uma menina (essa categoria às vezes se encaixa na do "Amor ♥♥").
E a roda do ônibus rodando pela cidade.
Gosto muito de ouvir mães e filhos adolescentes conversando. Quer dizer, mães falando e filhos adolescentes olhando pela janela com aquele olhar ansioso de "será que ela para de falar quando a gente chegar?". Eu não sei o que acontece, mas mães têm esse lance de escolher te criticar em público. Elas nunca comentam nada sobre como você se veste pra ir pra lugar nenhum, mas quando ela sai com você, é bem provável que ela vá falar alguma coisa da sua roupa. Mães sempre querem falar sobre o filho da prima da vizinha que passou no vestibular de medicina e vai fazer intercâmbio em Harvard e que fala inglês, francês, alemão, italiano, mandarim e esperanto. Isso se não comentar sobre o menino de 14 anos que passou no vestibular de medicina da federal de Sergipe. Mães também falam muito sobre fulana que não se dá o respeito ("você viu a roupa que ela estava usando naquela foto do feicibuqui?") e fala pra filha não ficar igual ela.
E a roda do ônibus? Aham, continua rodando.
Tem sempre também aquele grupo de jovens saindo da faculdade onde os assuntos transitam em faculdade, álcool e cultura pop. Adoro muito, talvez porque me identifico. Adorei a visão que uma nina do Mackenzie tem de Interstelar e o quanto todos parecem amar Game of Thrones e o fato de que não importa qual curso as pessoas façam, nem onde façam, desde de direito na Usp, até a administração na Uninove, todos odeiam alguma parte da vida universitária (deve ser por isso que álcool é tão frequente nas universidade? só assim a gente consegue passar pela graduação? vish.). Adoro ouvir que fulana de curso x pegou fulano de curso y na festa dos calouros. Adoro ouvir pessoas vestindo camiseta de anime conversando sobre a crise da economia europeia. Eu odeio a academia, mas eu amo esse clima de universidade que as pessoas deixam transparecer ao conversar no metrô.
Porque, sim, a roda do metrô também roda.
Acho que eu gosto de prestar atenção nessas conversas porque gostaria muito de saber como as outras pessoas me enxergam. Será que eu também sorrio dessa forma boba quando vejo uma mensagem no WhatsApp? Será que eu falo tanto assim de meninos? Será que as pessoas ficam abismadas com meus comentários sobre pegação? Será que ficam surpresas com minhas opiniões sobre Interestelar e a economia europeia? Queria saber se alguém lê meu WhatsApp também, porque, em geral, eu sou tão espectadora da conversa quanto qualquer estranho que bisbilhotar, já que não respondo nunca. Gosto de imaginar que alguém que me vê por aí com a camiseta do Paramore, fica surpreso, porque meus amigos sempre dizem que eu tenho cara de quem escuta funk. Ou que fica surpreso com o fato de eu gostar muito mais de exatas que de humanas, já que eu não tenho muito a aparência de estudante de matemática e afins.
E, sabe, tudo bem que eu repare tanto assim nas pessoas. Porque, eu desço, nós nunca mais nos encontramos, a vida não para porque eu sei que "a mãe da clarinha tá traindo o pai dela com o namorado da clarinha" e a roda do ônibus (ou da lotação, ou do metrô) continua rodando, mesmo depois de eu saltar.

*mas gente, o que uma conversa sobre uma estranha chamada 'clarinha' não me desperta de inspiração, hein. textão.

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